RESGATE
Os pandas da cultura
PROJETO PARCEIRO ESTÁ FILMANDO MANIFESTAÇÕES CULTURAISDA REGIÃO NORTE. MUITAS DELAS CORREM PERIGO DE DESAPARECER
Desde meados do ano passado, os integrantes do projeto Parceiro estão à caça de espécies culturais em extinção. A equipe de cineastas e antropólogos está registrando em vídeo manifestações culturais da região Norte do Estado, algumas delas em vias de desaparecer. Entre esses pandas da cultura, estão benzedeiras, grupos de dança alemã, tecelões de fibras de tucum e o último construtor de canoas de um pau só da Vila da Glória.
O projeto, financiando pelo Funcultural do Governo do Estado de Santa Catarina, será finalizado até o final de 2009. Todos os depoimentos gravados formarão um banco de dados da cultura do Norte de Santa Catarina, que poderá ser usado por escolas e pesquisadores. Muriel Szymczak, produtor do Parceiro, está satisfeito com o resultado. “Encontramos figuras fantásticas. Em Araquari, conhecemos o seu João Evilásio, um senhor de 90 anos que ainda tece com fribras de Tucum. As cordas feitas por ele são as mesmas usadas no tempo da colonização”, relata Muriel.
Na Vila da Glória, eles encontraram o último construtor de canoas de um pau só, Belarmino de Borba, o seu Belo. As embarcações são construídas com um único tronco, sem emendas. “É um costume bugre, que data de uma época em que eles não contavam com pregos ou outra forma de unir os pedaços de madeira. Esse senhor de 77 anos é a última pessoa da Vila da Glória que domina a técnica, mas ele teve um derrame e não está mais construindo canoas”, lamenta Muriel.
A equipe, que conta também com os cineastas Henrique Tobal Neto e Robson Luis, não descansou nem mesmo no Natal. Na data, eles estavam filmando o Catumbi de Itapocu. Segundo a lenda, a tradição nasceu de uma promessa feita a Nossa Senhora do Rosário. Em 1854, o escravo Manuel Bengala chegou à vila de Itapocu, localidade de Araquari. Na bagagem de Bengala, encontrava-se a imagem de Nossa Senhora do Rosário (que está até hoje na comunidade). A adoração à estátua resultou na criação de uma irmandade e de uma igreja, que levam o nome da santa.
O diretor Henrique Tobal Neto conta que o Catumbi de Itapocu é o único que ainda dança o catumbi no Estado. “É interessante a posição dos mais jovens. São eles que estão tocando esse costume, enquanto os mais velhos parecem estar cansados da tradição”, aponta Tobal.
Em Joinville, o Parceiro já entrevistou o grupo de dança alemã Silberfluss e Benta Bittencourt da Silva, uma benzeira do bairro Floresta. “Ela deu uma verdadeira aula de biologia. A dona Benta é muito procurada pela comunidade, mesmo com os avanços da medicina. Por sinal, tem gente que pega ‘passe’ com ela antes de entrar no hospital!”, diz Muriel.
rodrigo.schwarz@an.com.br